Foi sua avó paterna – dona Anna – quem lhe contou sobre a grande aventura que foi chegar ao Brasil. Ela e seu marido Pedro vieram do Tirol a bordo de um navio repleto de imigrantes italianos. Foram três meses no mar até alcançar o destino: o Brasil, onde a família Zen começou a escrever sua história a partir da década de 1870.
Filho de Carlos Zen e Adelina Moretão, Hylário nasceu em Brusque. A família morava na comunidade de Poço Fundo, a cerca de 35 minutos de caminhada da Tecelagem Renaux, onde Carlos trabalhava como tecelão. Carlos acordava às 4h da manhã, iniciava o turno às 5h e seguia até 13h30. Depois do almoço, ia para a roça, cultivando a terra para ajudar a sustentar a família.
Hylário era o filho mais velho. Auxiliou os pais na roça até a adolescência, seguindo os passos do pai operário. Na Tecelagem Renaux, começou como ajudante de ferreiro — como eram chamados os ferramenteiros — e carregou muita espula até se firmar na fábrica. Oito meses depois, ganhou do pai uma bicicleta usada, o que lhe permitia dormir um pouco mais antes do apito da fábrica. De ajudante de mecânico passou a mecânico titular do turno da tarde, substituindo um tio de Ivo Batschauer. Sua principal atividade era consertar teares.
A vida na casa dos pais e as memórias dos antepassados
Na casa de Carlos e Adelina Zen, todos trabalhavam em prol de todos. O respeito e o espírito de união eram pilares entre o casal e os filhos. O salário da tecelagem ficava sob a guarda da mãe, e o sábado era o dia da partilha. Após o trabalho, o trato das vacas e o banho de cachoeira, a família se reunia à mesa para fazer as contas.
As compras eram mensais e a crédito, anotadas em cadernetas. A Tecelagem Renaux mantinha uma venda em regime de cooperativa, onde se fazia a primeira partilha do dinheiro. A segunda parte ia para a venda do Eduardo Pecker — depois assumida por Pedro Zucco — na entrada antiga do Poço Fundo, para suprir as necessidades do dia a dia.
Rumo a São Paulo em busca de aperfeiçoamento
Hylário não queria apenas continuar na fábrica. Desejava ampliar seus conhecimentos e frequentar cursos profissionalizantes. Considerou estudar mecânica no Senai de Blumenau, mas entendeu que o melhor caminho era São Paulo. Foi para lá em 1949, durante suas férias, com o objetivo de conhecer a cidade, buscar especialização e avaliar a possibilidade de morar e trabalhar na capital.
A viagem por estrada de terra levou dois dias
Rodovia asfaltada até São Paulo, em 1949? Nem em sonho. A viagem durou dois dias por estradas de terra e curvas intermináveis. Foram 260 km até Curitiba, onde pernoitaram, e mais de 400 km até São Paulo. Na volta, um susto: o ônibus sem freio quase caiu em um abismo. O motorista jogou o veículo contra um barranco e o tombou lentamente. Ninguém se feriu gravemente.
Zen voltou decidido: São Paulo seria seu novo destino. Pediu as contas na Tecelagem Renaux e recebeu da família um auxílio modesto — três notas amarelas de mil réis. Antes de partir, ouviu do pai: “Vai, mas não esquece de uma coisa... Me falaram que São Paulo também tem igreja.” A vida simples e feliz, dividida entre a fábrica, a roça, a bicicleta e os banhos de cachoeira, ficou para trás.
Nos primeiros dias, ficou na casa do amigo Ivo Batschauer. Depois, mudou-se para uma pensão e conseguiu emprego como torneiro mecânico na empresa Baroc S/A. Vieram anos de muito aprendizado e trabalho.
Irmãos Zen — uma empresa nascida em São Paulo
No final de 1950, ao visitar a família em Brusque, Hylário convidou o irmão Nelson para morar e trabalhar em São Paulo. Casou-se com Evelina Dubiela em 1955 e, cinco anos depois, fundou com Nelson a Irmãos Zen S/A, em janeiro de 1960.
O primeiro investimento foi uma prensa. A empresa funcionava em um porão de 13 m², onde cavacos voavam para dentro da cozinha. Em fevereiro, Osmar Zen se juntou aos irmãos. Em maio, a empresa foi registrada. Começaram com ferramentas, depois passaram a estampá-las. Juntaram capital e compraram um terreno para construir uma fábrica de 60 m². Logo, o espaço ficou pequeno. Construíram um galpão de 1.000 m². Também ficou pequeno.
Buscaram novas áreas na periferia de São Paulo. Até que, em visita a Brusque, Hylário encontrou o industrial Carlos Cid Renaux, que sugeriu contato com o prefeito José Germano Schaefer, o Pilolo. Em 1974, dois anos após esse encontro, foi adquirido o terreno onde a Irmãos Zen S/A permanece até hoje.
Existe fórmula para o sucesso de um empreendedor?
Ao longo de sua trajetória, Hylário Zen construiu muito mais do que uma empresa. Construiu valores, relações e oportunidades. Para ele, o dinheiro ajudava, mas o que mais importava era ter vida. O estudo foi essencial — sem ele, talvez a empresa não tivesse nascido.
Empreender, segundo Zen, era também transformar a vida das pessoas ao redor. Os segredos para o sucesso eram simples: ser honesto consigo mesmo, trabalhar com dedicação, estudar sempre — o aperfeiçoamento é fundamental — e buscar agregar valor ao que se produz. O crescimento de uma empresa não deveria ser ambicioso, mas natural.
Hoje, sua história permanece como legado. Uma trajetória marcada por coragem, visão e integridade. Esta é uma homenagem póstuma a Hylário Zen — um homem que viveu com propósito e deixou marcas profundas na indústria, na comunidade e na memória de todos que o conheceram.